Mar à Pedra

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domingo, 1 de junho de 2014

Os Canibais



Os tempos que vivemos evidenciam um claro retrocesso civilizacional. A indiferença com que o mundo ocidental lidou nos conflitos da ex-Jugoslávia e do Ruanda e, mais recentemente, com o que sucedeu na Síria e Ucrânia denota uma clara insensibilidade e inaptidão política de gerir estes processos por via diplomática. A forma como a Humanidade tem lidado com estas crueldades, sem qualquer punição em tempo útil, denota um abandono dos primários princípio de solidariedade e justiça.
Após o flagelo bélico mundial que sucedeu por duas vezes no século XX, que levou a que as mais variadas nações optassem pela paz, pelo diálogo e pela união. O verdadeiro exemplo disso foi o surgimento de um projeto que defendia uma união económica e política no continente europeu. Se o último item gerava imensa discussão, no que concerne à independência dos estados, o projeto de união económica foi, paulatinamente, dinamizado, transformando um continente destroçado pela guerra num modelo económico sui generis, ainda para mais, quando buscava a igualdade entre estados. Mais recentemente, tudo tem vindo a mudar. Uma vez mais, nasce no norte da europa, no núcleo franco-germano, um modelo de governação focalizado em estímulos individualistas e egocêntricos. Reina a xenofobia, o racismo e a cobiça.
Como tudo na vida, tudo tem um fim. Os tempos de ganância e individualismo fazem recordar os primeiros momentos do sectarismo do nacional-socialismo, que apesar de tudo, foi um modelo que vigorou por grande parte da europa e até pelo continente americano até ao último quartel do século XX. Fator não menos importante deveu-se à hegemonia do sistema capitalismo sob qualquer outro modelo económico e social. O neo-liberalismo ingeriu nas sociedades ocidentais de forma paulatina, contudo, hoje é um modelo que está em plena expansão. Se em alguns momentos se poderia aceitar a revigorante mudança económica, a verdade é que a forma como o ser humano tem sido desvalorizado, por si próprio acaba por gerar um egoísmo natural, sentimento inato do ser humano, visto que a lei natural ordena que prevaleçam os mais fortes. Nesta espécie humana, este sentimento tem-se esbatido, no entanto, é visível que em momentos de dificuldade o humano torna-se egocêntrico, focalizado num individualismo primitivo que, ao longo dos tempos, se foi atestando ser a génese dos conflitos e retrocessos civilizacionais.
Hoje não existem surpresas (dizem alguns), reina a lei da selva (afirmam outros). Não poderia estar mais de acordo. O que mais me assusta é que os mais basilares princípios da democracia começam a ser beliscados. Poucos se importam que a Constituição Portuguesa tenha sido violada, consecutivamente, nos últimos três anos. Mais perigoso é quando alguém que jura defender a Constituição permite que esta seja violada sem que tire desses atos consequências políticas. O mesmo que definia a determinado momento de convulsão económico como "explosivo", ultimamente, o mesmo ser humano promove o silêncio como forma de arbitrar. Como em qualquer desporto, o árbitro só é bom se promover a verdade e a justiça. Quem não assinala faltas perigosas e não expulsa quem agride voluntariamente não pode ser árbitro. Um árbitro serve para arbitrar e, geralmente encontra-se munido de um apito.
Como já referi, vivem-se tempos diferentes, mas já vividos no passado por outras gerações. O que não esperava é que numa força política que tem vindo a combater, com mais ou menos vigor, esta tendência canibalista da sociedade, se utilizassem estratagemas que apelidaria de anti-democráticos, apenas e só, com o objetivo de alguns alcançarem o poder. Se por um lado os focos estão centralizados em duas individualidades, não tenho qualquer dúvida que as verdadeiras movimentações erguem-se de forma sub-reptícia, quer por forças capitalistas que já entenderam que a continuidade de governação, via PSD-CDS será uma miragem, dentro de um ano; junto disso, nasce agora, de forma despropositada e de forma duvidosa a clara vontade de mudança interna no PS, promovida no interior da estrutura maçónica, promovendo um dos seus membros para a tábua do poder. Se estas movimentações escapam à maioria dos cidadãos, estas só evidenciam o que de mais pútrido emana do ser humano: a cobiça!
A mim tudo isto me aflige. As pessoas são totalmente secundarizadas em todos estes inúmeros conflitos. O ser humano é mesmo feito para guerrear. O genoma pode ser manipulado de inúmeras formas, mas a ganância ainda não se conseguiu extrair do ADN humano. É curioso que o que mais emerge do mamífero mais apto a sobreviver num mundo de tumulto é a ganância. O mesmo atributo que, sucessivamente, tem gerado e destruído impérios. Resta esperar que um dia, espero que em breve, a ganância deixe de ser uma característica humana. Enquanto assim não for continuarão a morrer inocentes, continuará a haver fome no mundo, enfim, continuaremos a viver num mundo de desigualdades. 
É o simples ato de lutar contra este flagelo da desigualdade social que me mobiliza como cidadão. Não aceito que alguns se continuem as alimentar da "carne dos inocentes". 
Um canibal não produz nada: limita-se a aguardar que um semelhante cometa erros e, nesse momento, promove o ataque. Esquece-se é que um dia a carne acaba e surge o osso. 
Há que dignificar a sociedade e devem ser os mais ilustres dessa sociedade a dar o devido exemplo. Num momento em que os políticos são a mancha da democracia é necessário inverter o distanciamento dos governantesem relação às comunidades. Qualquer que seja o modelo de pensamento existem características não se poderão nunca desvanecer numa sociedade: Honestidade, Solidariedade, Igualdade e Justiça. Enquanto tal não suceda apenas nos resta aguardar pelo eterno adeus aos canibais.

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